Close

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Longa belga, vencedor do prêmio da crítica em Cannes e indicado ao Oscar de Filme Internacional em 2023, chega agora aos cinemas e, em abril, estreia na Mubi.
Léo e Rémi não estão mais lado a lado e nem no mesmo plano

Vira e mexe, o cinema entra em ciclos temáticos. A gente tem visto muitos filmes sobre a relação de pais e filhos, por exemplo. Mas um dos temas que eu menos esperava e que está aí, e com filmes bons, é a amizade entre homens. Dentro desse contexto, recentemente, nós tivemos o ótimo Os Banshees de Inisherin e agora, Close, longa belga vencedor do prêmio da crítica em Cannes e indicado ao Oscar de Filme Internacional em 2023. O longa chega agora aos cinemas e, em abril, estreia na Mubi.

Os dois filmes se distanciam muito, se pensarmos que Banshees trata de homens na casa dos 40, 50 anos e Close, é sobre dois garotos de 12 ou 13 anos. Mas, têm em comum o fato de que duas fortes amizades vão ser abaladas por causa de um dos lados e ninguém é capaz de se comunicar com clareza.

A dificuldade de comunicação permeia todo o longa, dirigido por Lukas Dhont e escrito por ele juntamente com Angelo Tijssens. E isso é mais do que natural, afinal, estamos falando de crianças. E Léo (Eden Dambrine) e Rémi (Gustav De Waele) não são como as crianças de hoje, que vivem enfiadas em celulares, são garotos do interior da Bélgica que passam o dia correndo entre plantações de flores e usando a imaginação para brincar. E à noite, ainda dormem um na casa do outro, eles são literalmente inseparáveis. Até que essa proximidade chama a atenção de outras crianças na escola, começam as insinuações de que são um casal a bonita e a singela amizade dos dois é abalada.

O sol ainda brilha e o campo está florido, mas Léo e Rémi não estão mais lado a lado e nem no mesmo plano. (Imagem: trailer oficial)
O sol ainda brilha e o campo está florido, mas Léo e Rémi não estão mais lado a lado e nem no mesmo plano. (Imagem: trailer oficial)

As cores de uma amizade

E aí vem a pergunta: Léo e Rémi tinham mesmo um interesse amoroso um pelo outro? E a resposta é: não importa. Por um lado, temos, sim, demonstrações de afeto, olhares carinhosos de profunda admiração, a dependência que um tem do outro. Por outro lado, são crianças, que felizmente trocam as telas pela companhia uma da outra. Eles são muito novos para entender qualquer coisa, quanto mais algo complexo como a sexualidade. É o mesmo ponto de Luca, da Pixar, não tem problema nenhum se eles forem homossexuais e se interessarem um pelo outro, mas o que eles demonstram é um comportamento de garotos.

E é curiosa a forma como, inicialmente, Léo lida com a questão, ao apontar que as meninas que falavam que eles eram um casal faziam as mesmas coisas e ninguém dizia nada, ele considera Rémi um irmão. E Dhont é muito hábil ao colocar Léo primeiro dormindo de conchinha com Rémi e, mais pro final, com o irmão de sangue, o que mostra que o mundo não é definido só por preto e branco. No meio, também tem o vermelho de Rémi e o amarelo de Léo.

Eu cito as cores porque são muito significativas no filme, em um trabalho bem realizado de fotografia (Frank van den Eeden) e design de produção (Eve Martin). Repare como a casa de Rémi tem bastante amarelo, mas o quarto dele é vermelho, é um indicativo do tamanho de Léo na sua vida, é o que ele mais tem de importante ao seu redor. E, mais adiante, vemos como Léo passa a carregar Remi no peito com um detalhe em vermelho no seu casaco. Além dos momentos que vemos Rémi refletido no amarelo ou Léo coberto por luz vermelha, os dois estão muito presentes um no outro.

Léo, com seu amarelo sendo tomado pelo vermelho de Rémi. (Imagem: trailer oficial)
Léo, com seu amarelo sendo tomado pelo vermelho de Rémi. (Imagem: trailer oficial)

A construção da história

É interessante observar os elementos que Dhont usa para construir a narrativa. O diretor opta por praticamente só utilizar tomadas fechadas. A câmera está quase sempre próxima dos personagens, o que mostra como o mundo daqueles meninos, daquelas pessoas no geral, é fechado, é reduzido, e isso faz com que tudo que ocorre entre eles tenha um peso muito maior.

Outro elemento que Dhont usa pra demonstrar a subjetividade dos seus personagens é o clima. O sol, as flores coloridas e a alegria do começo do filme contrastam com o escuro, a chuva e as flores destruídas, depois da primeira briga entre Léo e Rémi.

Os campos floridos e ensolarados dão lugar à chuva e às flores mortas caídas conforme os conflitos entre os personagens escalam. (Imagem: trailer oficial)
Os campos floridos e ensolarados dão lugar à chuva e às flores mortas caídas conforme os conflitos entre os personagens escalam. (Imagem: trailer oficial)

Atenção, agora tem spoiler!

Não é só porque a gente traz no nome, mas para tratar de uma questão fundamental da trama, é preciso entrar em spoilers da história. Então, para ler a partir daqui, eu recomendo que assistam ao filme antes.

A naturalidade também é um dos focos de Dhont em Close e o diretor usa disso para tratar da consequência do maior acontecimento do filme, é assim que ele busca retratar o luto. Primeiro que, de forma inteligente e respeitosa com a proposta e com os espectadores, Dhont e Tijssens, jamais mostram o ocorrido de forma explícita, não precisamos ouvir a palavra “suicídio” para sentir o peso do que aconteceu. Já percebemos bem com a tensão crescente de Léo no ônibus, voltando do passeio da escola.

E Léo é uma criança, não sabe se expressar, especialmente porque se considera culpado. Ele vai, naturalmente, colocando o seu luto para fora aos poucos. Até que admite baixinho para o irmão que sente falta de Rémi. A partir daí ele literalmente desaba. E é natural também a reação inicial da mãe de Remi, Sophie (Émilie Dequenne) ao ouvir a absurda confissão de culpa de Léo. Até que ela cai em si e abraça o garoto, não sem antes vê-lo, desesperado de culpa e medo, tentando se defender com um galho e um braço quebrado, em um grande momento do jovem e bom ator Eden Dambrine.

Luto é um dos sentimentos mais complexos que nós enfrentamos, se assemelha ao mar, que às vezes traz marolas, às vezes traz ondas gigantes e outras vezes está calmo. E, no fim, assim como as flores que Léo aprendeu a plantar, a vida recomeça, o sol volta a brilhar e o campo volta a se encher de flores coloridas. Mas nunca mais vai ser completo, sempre vai ficar o vazio de olhar pra trás e ver que a pessoa que a gente tanto queria que viesse não vai chegar.

Avaliação SQLVS: 90 poltronas amarelas

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